Pesquisadores publicam revisão de dados sobre o fungo Escovopsis e sua relação com as formigas cultivadoras de fungo

Um grupo de pesquisadores vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Entomologia da UFV e ao Departamento de Biologia Geral e Aplicada da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) acaba de publicar um artigo de revisão sobre o fungo Escovopsis e sua relação com as colônias de formigas cultivadoras de fungo. O trabalho “The fungus Escovopsis (Ascomycota: Hypocreales): a critical review of its biology and parasitism of attine ant colonies” é assinado pelo professor orientador Simon Elliot e pela egressa Marcela Caixeta – além de André Rodrigues e Quimi Montoya, da Unesp – e é resultado de um trabalho iniciado há quase duas décadas.
“Desde que eu cheguei à UFV, em 2006, eu já queria trabalhar com esse sistema. Ao longo destes anos, tive algumas alunas fazendo estudos nessa área, especialmente Marcela Caixeta, Débora Mendonça e Juliana Augustin. Esses trabalhos foram a semente dessa revisão”, explica Simon, citando também a colaboração do professor britânico Harry Evans, em suas múltiplas passagens por Viçosa. “Por volta de 2013, identificamos aqui novas espécies e um novo gênero, inclusive com a ajuda do pessoal de Fitopatologia na época. Mas o André já estava trabalhando nisso, na Unesp, e começamos uma colaboração. Lá, o Quimi Montoya descreveu depois dois novos gêneros e várias novas espécies.”
O fungo Escovopsis desperta especial interesse porque está associado a dois fenômenos que contribuem para aumentar a complexidade dos sistemas biológicos: as interações simbióticas mutualistas e a evolução da socialidade. Em seu papel de ameaça ao jardim de fungos das formigas atinas, como as cortadeiras, ele representa o desafio que esses organismos e as simbioses mutualísticas precisam superar. “Esse é um caso clássico dessa interação entre os organismos, e conhecer os organismos, por causa dessa associação, é muito importante, especialmente nas Américas tropicais. Além disso, as cortadeiras são os insetos sociais com maiores colônias, com as maiores sociedades biológicas”, explica o professor. “Como tem muita gente interessada em como organismos e sociedades se defendem contra parasitas, esse organismo tem sido muito estudado, como um modelo de parasita que ataca uma sociedade de modelo simbiótico em um inseto social. Então é um conjunto de áreas interessantes, e esse fungo tem sido estudado por cientistas de renome no mundo inteiro.”
O trabalho publicado agora na Frontiers in Fungal Biology explora Escovopsis e três gêneros próximos – Escovopsioides, Luteomyces e Sympodiorosea -, descrevendo sua posição como de grande interesse científico e revisando a história taxonômica do grupo e sua macroevolução e biogeografia. O texto também sugere, ao contrário do que foi indicado ao longo das últimas décadas, que Escovopsis é um parasita com virulência muito baixa. “Nossos esforços têm mostrado quem são os fungos de fato. Está muito espalhado na literatura que esse fungo e seus parentes são altamente virulentos, mas a gente não observa isso no campo. A Débora Mendonça realizou um trabalho com 3 espécies diferentes mostrando que não causam tanto dano.”
Ao sintetizar e organizar as informações, o grupo de cientistas também abre espaço para o que ainda é desconhecido, contribuindo na construção de perguntas capazes de direcionar novas pesquisas. “Muitas coisas ainda precisam ser vistas. Um exemplo seria se realmente esse fungo está sendo carregado pelas fêmeas na revoada, o que ninguém nunca explorou com técnicas moleculares. Outra pergunta seria como o fungo vai de uma colônia para a outra, no campo. O fato é que, nessa explosão de novos gêneros e novas espécies, sabemos muito pouco sobre eles.”
Foto: Laboratório de Interações Inseto-Microrganismo
Parceria com Itália impulsiona pesquisas e garante dupla titulação a doutores

Três anos após a viagem que oficializou a parceria entre a professora Maria Augusta Lima Siqueira, do Programa de Pós-Graduação em Entomologia, e a professora Gaetana Mazzeo, da Università Degli Studi di Catania (UNICT), o trabalho conjunto segue firme e rendendo frutos. Na última semana de fevereiro, a pesquisadora brasileira Lívia Maria Negrini Ferreira (na foto acima) defendeu em Viçosa sua tese de doutorado, desenvolvida após um período sanduíche na Itália. Pouco antes, o pesquisador Roberto Catania havia defendido em Catânia seu trabalho, parcialmente realizado no Brasil. Ambos os doutores receberam dupla titulação. Em janeiro, outra estudante italiana, Marta Bonforte, chegou à UFV para um período de intercâmbio, com a mesma meta.
“Tudo isso de fato supera em muito as minhas expectativas. Quando eu fui pra Catânia, não imaginava que a gente ia continuar trabalhando em uma parceria tão coesa, tão produtiva e por tanto tempo”, avalia Maria Augusta. “Em praticamente dois anos, já temos o terceiro aluno de doutorado em cotutela, com benefícios que vão muito além do treinamento dos alunos”, ela diz, destacando os vários artigos já publicados advindos da parceria iniciada em 2022.

O grupo de pesquisadores têm seus esforços focados em abelhas e suas diversas relações com a produção agrícola. Roberto, que passou cerca de oito meses no Brasil, avaliou o efeito de diferentes pesticidas sobre abelhas, incluindo espécies encontradas nos dois países. Já Lívia trabalhou com um espectro menor de espécies, uma típica de cada país, mas com diferentes poluentes. “Em geral, demonstramos que indivíduos e colônias de abelhas silvestres estão em alto risco de exposição a uma ampla gama de agrotóxicos.”
Para a recém doutorada, o período na Itália teve impacto importante no resultado final. “Tive a oportunidade de trabalhar com espécies de abelhas com as quais eu não tinha trabalhado e que são nativas da Itália”, conta Lívia, acrescentando que os aprendizados acabam sendo também divididos com os demais colegas de laboratório na volta ao Brasil. “É um modelo de trabalho muito efetivo e muito produtivo”, reforça Maria Augusta, “porque os estudantes têm treinamentos que jamais teriam em suas universidades de origem, considerando o perfil de trabalho dos laboratórios e as condições naturais de cada país, o que aconteceu tanto com a Lívia, quanto com o Roberto.”

Nova estudante
Marta chegou ao Brasil há pouco mais de um mês, e ficará pelos próximos seis meses trabalhando sob orientação de Maria Augusta. “Minha principal meta em Viçosa é ir mais a fundo na minha pesquisa e ganhar experiência internacional. Estar aqui vai me permitir trocar conhecimento e também aprender novas metodologias e colaborar com projetos inovadores. A minha expectativa é contribuir efetivamente com o time de pesquisadores.” Na Itália, Marta desenvolve pesquisas com a interação entre abelhas silvestres e cultivos agrícolas, estudando estratégias para aumentar a presença de polinizadores em agroecossistemas e consequentemente aumentar a produtividade agrícola. No Brasil, ela pretende ampliar esse estudo para a região tropical, ao trabalhar com abelhas sem ferrão nativas do Brasil.
Publicação internacional reúne seis artigos de pesquisadores do PPG sobre efeitos não-intencionais de bioinseticidas

O volume especial “Environmental Toxicology 2025: Non-target effects of Bio-insecticides”, lançado este mês pelo respeitado periódico científico “Current Opinion in Environmental Science & Health”, traz seis artigos de professores, estudantes e egressos do Programa de Pós-Graduação em Entomologia. Nos artigos, os autores apresentam suas contribuições e opiniões sobre os efeitos não-intencionais de bioinseticidas, baseadas em suas pesquisas e publicações realizadas nos últimos dois anos.
A coordenação da edição especial é do professor Raul Narciso Carvalho Guedes, orientador da Entomologia e Pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação da UFV, com a colaboração dos editores Giovanni Benelli (University of Pisa), Nicolas Desneux (Université Côte d’Azur) e Evgenios Agathokleous (Nanjing University of Information Science & Technology).
“Esse é um tópico importante e frequentemente negligenciado. Isto porque a diversidade do grupo dos bioinseticidas, com suas diferentes categorias, os torna mais difíceis de serem trabalhados, mostrando mais diversidade de respostas e riscos”, avalia Raul. “Mas a percepção de que são seguros e livres de risco é, no mínimo, temerária, para não dizer falsa. Assim, o alerta para esta deficiência de conhecimento e a falta de trabalhos a respeito reforça a relevância desse número especial.”
Ao todo, o volume especial traz 16 artigos, envolvendo o trabalho de dezenas de pesquisadores de diversas instituições. O próprio Raul assina “Bioinsecticides and non-target pest species“, ao lado dos pesquisadores Leonardo Turchen, egresso do PPG Entomologia, Ran Wang e o também editor Evgenios Agathokleous. O coordenador do PPG, professor Gustavo Martins, aborda a relação de bioinseticidas e mosquitos em “Biological mosquiticidal agents: potential and effects on non-target organisms“, em coautoria com a egressa Lorena Lisbetd Botina.
Frutos da parceria entre a UFV e a Universidade de Catania estão no artigo “Non-target effects of biopesticides on stingless bees (Apidae, Meliponini): Recent trends and insights“, assinado pelas professoras Maria Augusta Lima Siqueira, de Viçosa, e Gaetana Mazzeo, de Catania, e pelos egressos Rodrigo Cupertino Bernardes, Lívia Maria Negrini Ferreira e Roberto Catania. As formigas são tema do artigo “Non-target ants and bioinsecticides: A short review“, apresentado pela professora da Entomologia Terezinha Maria Castro Della Lucia e pelas egressas Karina Dias Amaral e Cidália Gabriela Santos Marinho.
Outro professor orientador a contribuir com o número é Eugênio Oliveira, que assina o artigo “Selective actions of plant-based biorational insecticides: Molecular mechanisms and reduced risks to non-target organisms” com os pesquisadores Guy Smagghe, Luis Viteri Jumbo, Gil Santos, Raimundo Aguiar e Lara Costa, doutoranda pelo PPG Entomologia. O sexto texto, “Expecting the unexpected: Plant-mediated and indirect effects of biopesticides on arthropod pests and their natural enemies“, é assinado pelo pós-doutor egresso Khalid Haddi, junto com M. Fernanda Peñaflor, Tiago Morales-Silva e Bruno Henrique Sardinha Souza.
Raul destaca a contribuição que o material disponibilizado oferece à sociedade. “Bioinseticidas vem tendo incremento acentuado de uso, com respaldo na legislação de insumos agrícolas de vários países. Contudo, e até por isto, a legislação costuma ser bem leniente com estes compostos, exceção cabendo principalmente à da União Europeia, que se mostra mais crítica a respeito e demanda testagem mais abrangente. O material publicado ilustra as características destes compostos, apontando desafios no seu estudo e utilização em escala comercial.”
Para Gustavo, estas publicações “refletem o reconhecimento internacional e a qualidade do corpo docente e discente do Programa, capaz de opinar sobre temas relevantes na área de entomologia e confirmam a capacidade do Programa de deixar sua marca em assuntos de vanguarda.”
Oitava edição do Simpósio Internacional já recebe inscrições

Estão abertas a partir desta quarta-feira, 26 de fevereiro, as inscrições para o VIII Simpósio Internacional de Entomologia de Viçosa, que acontecerá entre os dias 23 e 28 de agosto. O evento é realizado por discentes do Programa de Pós-graduação em Entomologia da UFV, com apoio da Sociedade Entomológica do Brasil (SEB).
O tema deste ano é “Insetos e clima: conexões invisíveis, efeitos globais”. A expectativa dos organizadores é reunir mais de 600 pessoas no espaço acadêmico-cultural Fernando Sabino, localizado no Centro de Vivência da UFV. Na programação, estarão palestras, mesas-redondas, apresentações de trabalhos e outras atividades voltadas ao estudo dos insetos e suas aplicações em diferentes áreas. Também está previsto o encontro do grupo de estudos Game of Bugs e a realização da festa oficial do evento.
Já estão confirmados nove palestrantes internacionais, 21 de outras instituições brasileiras e seis da própria UFV. “Nossa intenção é abordar os impactos das mudanças climáticas sobre os insetos, reunindo pesquisadores e profissionais renomados, nacionais e internacionais, que discutirão temas diversos da entomologia em palestras e mesas-redondas”, diz Gabriela Santos de Paula, da comissão coordenadora do evento.
Além de assistir às palestras, os participantes poderão submeter seus trabalhos, em português, inglês ou espanhol. Eles serão avaliados por um comitê científico e, se aprovados, serão apresentados como pôster e publicados nos anais do evento. Os melhores resumos serão também selecionados para apresentações orais.
As inscrições devem ser feitas diretamente no site do evento. Neste primeiro lote, o custo para estudantes de graduação é de R$ 190. Para estudantes de pós-graduação, R$ 280; R$ 350 para profissionais e R$ 290 para visitantes.
Foto: Divulgação VII Simpósio Internacional de Entomologia de Viçosa
Egresso se dedica à análise de risco para produtos de biotecnologia em multinacional nos EUA

Era fevereiro de 2015, há exatos 10 anos, quando Wilson Valbon, recém-formado engenheiro agrônomo, iniciou sua trajetória no Programa de Pós-Graduação em Entomologia. Hoje, mestre e doutor pelo PPG, ele é pesquisador entomologista da Bayer Crop Science, responsável pela análise de risco para produtos de biotecnologia. Wilson trabalha na unidade de Saint Louis, Missouri (EUA), e de lá atua com colegas de várias partes do mundo, incluindo egressos do PPG, com o desafio de atender às exigências do mercado e dos órgãos regulatórios de diferentes países. A vaga de pesquisador em uma das maiores multinacionais do ramo da agricultura não era exatamente o que ele tinha em mente quando iniciou sua trajetória, mas tornou-se um caminho natural depois das oportunidades de internacionalização que se abriram no doutorado.
“Minha primeira opção sempre foi Viçosa. Lembro perfeitamente, era 25 de fevereiro quando me matriculei no mestrado, orientado pelo professor Eugenio Oliveira. O trabalho era focado no efeito de pesticidas em organismos não-alvo, em insetos aquáticos predadores. Usava larvas do mosquito Aedes aegypti como modelo para entender a influência de pesticidas na interação presa-predador”, conta Wilson. Um ano e meio depois, ele defendeu sua dissertação e já deu início ao doutorado, também sob orientação de Eugenio. “Mudei um pouco a minha pesquisa. Continuei com o inseto aquático como modelo, mas foquei mais nas larvas do mosquito. E foi nesse momento que eu me aproximei do professor Gustavo Martins, que se tornou meu coorientador.”
No final de 2018, dois anos depois de iniciar o doutorado, Wilson conquistou, via Capes, uma bolsa de doutorado sanduíche e começou sua caminhada nos Estados Unidos. Sob orientação da professora Dra.K e Dong, na Universidade do Estado de Michigan (Michigan State University, MSU), ele iniciou os estudos sobre repelência de mosquitos, e conquistou mais um ano de bolsa, desta vez financiada pelo laboratório da professora. Em meados de 2020, em plena pandemia do coronavírus, depois de uma rápida passagem pelo Brasil, ele defendeu sua tese, mas manteve o vínculo como pesquisador do laboratório americano. No final do mesmo ano, Dra. Dong transferiu seu laboratório e pesquisa para a Duke University, no estado da Carolina do Norte, onde Wilson permaneceu como pós-doc até 2023. Nesse período, Wilson contribuiu para desvendar o modo de ação do piretro na repelência do mosquito Aedes aegypti.
“Minha ideia era ficar um ano por aqui, melhorar o inglês, aprender técnicas novas e voltar pro Brasil. Naquela época, ainda tinha expectativa de trabalhar como professor por lá. Mas no meu primeiro ano aqui eu vi que as coisas eram bem interessantes”, diz ele, destacando a receptividade do meio acadêmico para os pesquisadores brasileiros. “A gente, com os poucos recursos que tem, faz milagre no Brasil. E aí, quando se soma aqui os recursos financeiros e os equipamentos à experiência do brasileiro, dá muito certo.” Aos poucos, a ideia de voltar ao Brasil foi sendo substituída pela expectativa sobre o que o mercado poderia oferecer.

A oportunidade na Bayer veio em outubro de 2023, reconectando Wilson às atividades que ele realizou durante o mestrado e o doutorado. “O que eu faço hoje se assemelha mais aos trabalhos desenvolvidos em Viçosa do que ao pós-doc. Na UFV, eu trabalhei com organismos não-alvo e agora estou fazendo algo semelhante, mas com produtos de biotecnologia, como proteínas inseticidas expressas em plantas transgênicas.” Wilson é responsável por planejar e monitorar estudos com insetos benéficos (por exemplo, abelhas, joaninhas e crisopídeos) e preparar relatórios que serão enviados aos órgãos regulatórios dos EUA, como a Environmental Protection Agency (EPA). Esses estudos são parte de um dossiê sobre a segurança dos produtos desenvolvidos pela empresa, feito antes mesmo de serem comercializados. “É uma posição global. Meu trabalho é provar pro mundo que os nossos produtos são seguros.”
Ciência rigorosa
Neste início de ano, o pesquisador iniciará testes com um produto que está sendo desenvolvido especialmente para o mercado brasileiro. “Olha que coisa legal! Vejo que eu consigo contribuir de fato para a agricultura no Brasil. Quando eu comecei, eu não me via na indústria, talvez por um preconceito comum. Mas eu acho importante destacar que a indústria faz sim ciência rigorosa, como na academia. Aqui temos, inclusive, mais controle, por causa dos órgãos regulatórios, uma vez que boa parte dos nossos produtos são consumidos por humanos e animais.”
Na visão do pesquisador, os próximos anos ainda serão de muito aprimoramento e aprendizado dentro da empresa, já que cada produto traz desafios específicos. “Eu me sinto muito realizado, e por enquanto meu plano é ficar por aqui, enfrentando esses desafios.” Para o futuro, a expectativa dele é que outras portas se abram, não apenas no Brasil, mas também em outros países. “Tenho convicção do nosso potencial. Estou em uma multinacional, nos EUA, e não tenho diploma americano. Toda a minha bagagem vem do Brasil, e não deixa a desejar, em momento algum.”