Pesquisa identifica escala espacial que mais contribui para conservação regional de espécies de formigas

Considerando que vários processos ecológicos e evolutivos podem provocar mudanças na diversidade em diferentes escalas espaciais, a professora da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), Tatianne Marques, pós-doutora em Entomologia pela UFV, realizou um estudo em fragmentos de Mata Seca imersos em cinco biomas brasileiros. O estudo, que contou com a orientação do professor José Henrique Schoereder, teve como objetivo identificar a escala espacial que mais contribui para a conservação regional de espécies de formigas. No artigo “Ant diversity partitioning across spatial scales: Ecological processes and implications for conserving Tropical Dry Forests”, publicado na Austral Ecology, os autores afirmam que a diversidade de formigas observada entre fragmentos e entre ecorregiões foi maior do que o esperado ao acaso.

Foram amostradas formigas em fragmentos de Mata Seca e bioma adjacente: Mata Atlântica (Bahia), Caatinga (Minas Gerais), Cerrado (Goiás), Pantanal (Mato Grosso do Sul) e Pampas (Rio Grande do Sul). A amostragem foi realizada uma vez em cada fragmento, entre os meses de janeiro e maio, nos anos de 2008 e 2009, sempre próximo da estação chuvosa de cada região. Em cada fragmento foram distribuídos 15 pontos de amostragem, a 15 m de distância um do outro. Em cada ponto foi instalada uma armadilha com isca de sardinhas e mel nos microhabitats arbóreo, epigéico e hipogéico.

Para examinar os padrões de diversidade de formigas, construiu-se um projeto hierárquico com três escalas espaciais:  fragmentos de Mata Seca (escala local), Mata Seca e vegetação circundante (escala de paisagem) e ecorregiões brasileiras (escala regional). Também foi utilizado um modelo nulo para identificar variações na distribuição aleatória através de escalas espaciais.

Duas hipóteses foram testadas: I) em larga escala, as diferenças entre as ecorregiões têm mais influência na riqueza de espécies de formigas e a substituição de espécies locais variam entre fragmentos dentro das ecorregiões; e II) o grau de dissimilaridade na composição de espécies de formigas é maior entre os fragmentos de Mata Seca e a vegetação circundante do que entre Matas Secas das diferentes ecorregiões, indicando que tais florestas são relíquias de uma distribuição mais ampla dessa vegetação.

A partição espacial mostrou que a diversidade de formigas observada entre fragmentos e entre ecorregiões foi maior do que o esperado ao acaso. Quando se analisou o particionamento separadamente para cada região, a diversidade entre os fragmentos (Mata Seca e vegetação circundante) foi maior do que o esperado em todas as ecorregiões do Brasil. Isso demonstra que o filtro histórico que age na maior escala espacial analisada determina a diversidade de espécies de formigas.

Além disso, os resultados revelam que cerca de 75% das espécies de formigas não são compartilhadas entre os fragmentos (Mata Seca e bioma circundante) de uma mesma ecorregião. Assim, apesar das Matas Secas ocorrerem em manchas dispersas entre os diferentes biomas brasileiros, elas mantém sua identidade auxiliando a conservação das espécies pertencentes a esse ambiente.

Com base na composição e diversidade de espécies padrões, os autores destacam a importância da criação de mais áreas protegidas em toda a área de cobertura de Matas Secas, favorecendo um processo de conservação mais eficiente.

Aedes aegypti prefere depositar seus ovos em locais que contenham larvas de predador

Por causa dos efeitos da predação, o mosquito Aedes aegypti oviposita preferencialmente em habitats contendo larvas do predador Toxorhynchites theobaldi e larvas de coespecíficos mortas. Isso porque tanto a predação, como a presença do predador, fornece sinais químicos que indicam atividade de bactérias. Esta hipótese foi confirmada em um estudo realizado pelo doutor em Entomologia, Daniel Albeny Simões, e consta no artigo “Attracted to the enemy: Aedes aegypti prefers oviposition sites with predator-killed conspecifics”, publicado na Oecologia.

Para o estudo, foram realizados bioensaios de comportamento de oviposição no Laboratório de Comportamento de Insetos e Feromônios da UFV. Tanto o Aedes aegypti como T. theobaldi foram criados e mantidos a temperatura de 25±3°C, umidade relativa de 80±15% e fotoperíodo 12L : 12E. Já a avaliação dos efeitos da produção de bactérias foi realizada na School of Biological Sciences,  da Illinois State University, nos Estados Unidos. Aedes aegypti e Toxorhynchites rutilus, espécie norte-americana nativa, ecologicamente semelhante à T. theobaldi, foram mantidos em colônias a 25±5°C, umidade relativa de 70±15% e um fotoperíodo de 14L : 10E.

De acordo com o estudo, a predação por Toxorhynchites e os sinais químicos oriundos da predação aumentaram a abundância bacteriana no sítio de oviposição. Esse aumento é decorrente da presença de partes do corpo de presas não comidas pelo predador e pela liberação de exsudatos de ambos. Os resultados mostram que o ato de predação e a presença do predador  influenciam a escolha de sítios de oviposição e a composição da comunidade em sistemas aquáticos. Além de sugerir que a atração para oviposição é causada pelo aumento de bactérias, o trabalho também sugere que predadores como Toxorhynchites podem ser benéficos como agentes de controle biológico de Aedes aegypti.

Perfil: Carla Cristina Marques Arce

Desenvolver pesquisas em um centro de excelência na sua área de atuação é uma oportunidade desejada pela maioria dos pesquisadores. A doutoranda em Entomologia Carla Cristina Marques Arce, orientada do professor Eraldo Lima, não só desejou como vivenciou essa experiência no ano passado. Ela ficou de janeiro a dezembro de 2013, desenvolvendo pesquisas no Instituto Max Planck de Ecologia Química, localizado na cidade de Jena, na Alemanha.

No Brasil, Carla pesquisa sobre o efeito que o nematoide de raiz provoca em um inseto foliar via defesa de planta. Através do Programa Ciência sem Fronteiras, ela embarcou para a Alemanha com o propósito de estudar o processo inverso. No Instituto Max Planck, ela investigaria os efeitos que o inseto que se alimenta da planta provoca no nematoide. Entretanto, seu projeto de pesquisa teve que ser adaptado, pois a criação iniciada na Alemanha não produziu o número suficiente de nematoides. “Um ano parece muito tempo, mas para quem precisa fazer experimentos não é.” – afirma. Diante do imprevisto, Carla continuou investigando a defesa da planta e o efeito dessa defesa no inseto, contudo, sem a presença do nematoide.

Adaptar a sua pesquisa foi apenas um dos desafios que Carla teve que enfrentar. No Instituto Max Planck de Ecologia Química, ela foi orientada pelo pesquisador suíço, Matthias Erb. A orientação trouxe também muita cobrança: “Meus primeiros seis meses foram apenas de cobrança. ‘Se não sabe, aprende. Para estar aqui tem que ser bom’ – o meu orientador falava”. Apesar de toda a pressão inicial, Carla tirou de letra. “Corri atrás, executei o projeto, consegui fazer tudo. No final valeu muito a pena”.

Carla confessa que no início pensou em retornar ao Brasil. Mas passados alguns meses ela percebeu que aquele excesso de cobrança foi um estímulo para que ela explorasse todo o seu potencial. “Quando mostrei os primeiros resultados para o meu orientador, tudo mudou. Ele não fez nada para me prejudicar, tudo foi para eu mostrar o meu potencial” – avalia.

Com todas as dificuldades que enfrentou, Carla acredita que a pressão favoreceu o autoconhecimento. Ela percebeu que poderia superar seus limites. Além do crescimento no campo pessoal, no que diz respeito à sua formação, ela destaca o importante aprendizado na área de biologia molecular: “Aprendi muitas técnicas, eles têm muitos aparelhos. E a biologia molecular era necessária para o meu trabalho”.

Para ela, “lá, o modo de fazer ciência é diferente, eles são antenados com a ciência em geral. Culturalmente, eles têm muito compromisso com tudo o que se propõem a fazer. Desde pequenos, eles têm isso muito claro, querem fazer o melhor. E como dispõem da estrutura e do dinheiro necessário, isso reflete na qualidade da pesquisa que desenvolvem”.

Pela sua excelência e por ser o primeiro centro de estudo em Ecologia Química do mundo, o Instituto Max Planck atrai pesquisadores de todas as partes. Carla conta que no Departamento de Ecologia Molecular onde ela trabalhou, havia pesquisadores de 27 nacionalidades. “Conheci gente do mundo inteiro, países como Vietnã, Mongólia, Índia, China, Estados Unidos e vários outros”. Além da doutoranda em Entomologia da UFV, na época, outras duas brasileiras também trabalhavam no Departamento de Ecologia Molecular do Instituto.

A convivência com pessoas de tantos países diferentes proporcionou à Carla um rico intercâmbio cultural, mas também se revelou um grande desafio em termos de comunicação. Apesar de todos falarem o inglês, “cada nacionalidade tem um sotaque muito forte e isso é o mais difícil” – afirma.

Não bastassem os diversos sotaques, Carla que não domina a língua oficial do país,  ainda tinha que compreender o alemão para as atividades mais rotineiras. “Não sabia comprar nada. Eu fazia uma lição de casa antes de ir ao supermercado, pesquisava na internet o nome dos produtos. Sites de brasileiros que vivem na Alemanha ajudaram muito”. Quando o assunto é a receptividade do povo alemão, Carla é bem direta: “A fama do alemão não é boa e eu tive péssimas experiências”.

Localizada no estado da Turíngia, a cidade de Jena, onde Carla morou, é um dos mais importantes centros intelectuais da Alemanha. Com uma população de mais de 100 mil habitantes, tudo gira em torno dos centros de pesquisa e universidades. Dentre os destaques que a cidade abriga, estão a Universidade Friedrich Schiller de Jena, com mais de 450 anos de fundação, e a indústria Carl Zeiss, fabricante de lentes.

Vivendo nessa cidade intelectual, num ambiente inspirador, Carla revela que não poderia ter sido diferente todo o seu esforço durante o período em que viveu lá. Com defesa marcada para o dia 7 de agosto, Carla agora escreve a sua tese e acredita que a experiência vivida na Alemanha está sendo fundamental para a conclusão do seu trabalho. “Trabalhei muito mesmo, mas foi lucrativo”. E ela já planeja um pós-doutorado no exterior para meados de 2015. Agora, o destino será a Suíça, país onde atualmente trabalha o conceituado e exigente pesquisador, Matthias Erb.

Estudantes estrangeiros intensificam a diversidade e a internacionalização da Entomologia

Atualmente, a Entomologia conta com mais de 20 estudantes de mestrado e doutorado de outras  nacionalidades. Colômbia, Chile, Equador, Costa Rica e México são alguns dos países que contribuem para a diversidade e a internacionalização do Programa. Uma das principais formas de ingresso dos estudantes estrangeiros é através do convênio entre a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras (GCUB).

Pelo Programa de Alianças para a Educação e Capacitação (PAEC), universidades brasileiras recebem estudantes de outros países membros da OEA para realização de cursos completos de pós-graduação stricto-sensu, em níveis de mestrado e doutorado. O principal objetivo é “promover a maior integração das universidades brasileiras na região, incentivando o intercâmbio científico e cultural, melhorando a mobilidade estudantil internacional e apoiando o desenvolvimento humano de indivíduos notáveis nas Américas”.

O acordo de cooperação já possibilitou que 41 universidades brasileiras acolhessem até hoje, aproximadamente 550 estudantes. De todas as universidades participantes no Brasil, a UFV é a que já recepcionou mais estudantes. Somando as vagas oferecidas em 2011, 2012 e 2013, a UFV recebeu um total de 68 estudantes pelo PAEC. E boa parte deles concluiu ou está cursando o mestrado ou o doutorado em Entomologia. O Programa é um dos que mais recebe estudantes pelo PAEC na UFV.

Desde o início do convênio, em 2011, a Entomologia manifestou interesse em recepcionar estudantes de outros países. O professor Simon Luke Elliot, coordenador do Programa de Pós-Graduação, explica que “a participação no PAEC faz parte da política da Entomologia de sempre buscar a heterogeneidade do grupo, estimulando a vinda de pessoas de fora. A  adoção dessa política também pode ser evidenciada no recrutamento de docentes, na aplicação da prova de seleção em diversas regiões do Brasil e também no incentivo que damos para que nossos estudantes façam algum programa sanduíche em outros países. Como biólogo, sei da importância deste processo de mistura para a  evolução”.

No PAEC, a bolsa concedida ao estudante estrangeiro é de responsabilidade da universidade que o acolhe. A seleção dos candidatos ocorre da seguinte forma: o programa de pós-graduação faz a pré-seleção e um Comitê Científico de Avaliação indicado pelo GCUB faz a seleção final. De acordo com o professor Simon, na Entomologia, a pré-seleção dos candidatos ao mestrado e ao doutorado é feita com base nos currículos, priorizando estudantes vindos das melhores universidades e que já receberam premiação.

Pelas regras do PAEC, o estudante só pode ser contemplado uma única vez, ao mestrado ou ao doutorado. Por exemplo, um estudante que foi contemplado com uma bolsa do PAEC no mestrado não pode receber outra bolsa pelo mesmo convênio para o doutorado.  O professor Simon afirma que a primeira participação no PAEC foi uma experiência muito positiva para a Entomologia. Tanto é que muitos estrangeiros que ingressaram pelo PAEC no mestrado em 2011, se inscreveram no processo seletivo regular da Entomologia, foram aprovados e hoje estão fazendo doutorado.

Um dos critérios que os estudantes devem atender para se candidatar ao PAEC é ter tido um ótimo desempenho acadêmico no seu país de origem. A microbióloga Angela Benavides Martinez veio da Colômbia para o Brasil neste ano para iniciar o mestrado em Entomologia, através do PAEC.  Ela destaca que o programa de cooperação com o Brasil é a oportunidade que ela buscava para fazer uma pós-graduação e aprofundar seus conhecimentos sobre controle biológico por meio de microrganismos. Angela concluiu a sua graduação em 2003 e trabalhou por dez anos em uma empresa privada em Bogotá. De acordo com a microbióloga, estudar na Colômbia é muito caro e o governo local não oferece bolsas. Assim, as oportunidades oferecidas por outros países para qualificação profissional surgem como um reconhecimento aos bons alunos.

Estudo investiga a mediação de sinais visuais do macho na atração sexual de vespas sociais

Pesquisadores da UFV investigaram a ocorrência de sinais visuais do macho mediando a escolha de parceiro sexual pela fêmea da vespa Polistes simillimus. Os resultados da pesquisa conduzida pelo doutorando em Entomologia, André Rodrigues de Souza, sob a orientação do professor José Lino-Neto, foram publicados na PLOS ONE, no mês de maio. No artigo “Sexy Faces in a Male Paper Wasp“, os autores indicam que a pigmentação preta na face de machos de P. simillimus parece desempenhar um importante papel na seleção sexual.

Para o estudo foram coletadas 15 colônias com produção de machos de P. simillimus em Viçosa (MG), na região sudeste do Brasil,  entre os meses de janeiro e abril de 2013. As colônias foram mantidas em laboratório em containers plásticos. Foram analisados adultos machos e fêmeas coletados no campo, bem como adultos recém-emergidos em laboratório. Além da ocorrência de sinais visuais de machos mediando a escolha do parceiro sexual pela fêmea, foram investigadas também as relações de dominância entre os machos.

Os pesquisadores identificaram três características visuais notáveis, variáveis e sexualmente dismórficas: pigmentação preta na cabeça, um par de manchas amarelas abdominais e o tamanho do corpo. A fim de testar se cada uma dessas características está associada às relações de dominância entre os machos e/ou à escolha da fêmea, foram realizados ensaios de comportamento. Além disso, a pigmentação preta na cabeça dos machos foi manipulada com tinta para testar se as fêmeas avaliam essa coloração.

Após a realização dos ensaios comportamentais, foi identificado que nenhuma das três características visuais está associada à relação de dominância entre machos. Entretanto, os machos com maior proporção de pigmentação facial preta e com maiores manchas amarelas abdominais são comumente escolhidos como parceiros sexuais.

Depois de manipular experimentalmente a proporção de pigmento preto na face dos machos com tinta, os pesquisadores concluíram que as fêmeas podem avaliar a coloração facial dos machos durante a escolha de um parceiro sexual. Diante disso, os autores sugerem que a seleção sexual é frequente em P. simillimus e destacam a importância desse grupo como modelo para o estudo da comunicação visual em insetos.