Estudo relaciona queda na virulência à estratégia de sobrevivência de vírus que ataca a soja

Um artigo publicado na revista Virus Research revela a relação entre a redução da virulência e o crescimento da diversidade e da adaptabilidade do cowpea mild mottle virus (CPMMV), que ataca plantações de soja em todo o Brasil. O trabalho “Experimental evolution of cowpea mild mottle virus reveals recombination-driven reduction in virulence accompanied by increases in diversity and viral fitness”, assinado por pesquisadores dos departamentos de Fitopatologia e de Entomologia da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e da Universidade Federal do Ceará, apresenta experimentos feitos em laboratório e em casa de vegetação, envolvendo neste último caso a mosca-branca (Bemisia tabaci), transmissora do CPMMV. A infecção por CPMMV causa sintomas variados e tem grande impacto na cultura da soja por sua capacidade de causar necrose sistêmica na planta. 

Em laboratório, os pesquisadores descobriram que o vírus perde virulência à medida que novas gerações de plantas vão sendo infectadas, umas pelas outras. “Partimos de uma planta infectada, dela vieram 3, e depois, de cada uma dessas, outras 12, e assim em diante, até que passamos por seis gerações. E à medida que íamos inoculando as gerações, o sintoma ia ficando mais brando, mais leve. O vírus estava se modificando, e fomos percebendo que a variação do sintoma (da doença) que é descrita no campo também era causada pelas novas variantes”, explica Larissa Zanardo, primeira autora do texto, que realizava na época do experimento seu trabalho de doutorado pelo Programa de Pós-graduação em Genética e Melhoramento da UFV, e hoje cursa seu pós-doutorado pelo Departamento de Fitopatologia

A tese de Larissa teve orientação dos professores Francisco Murilo Zerbini e Claudine Carvalho, do departamento de Fitopatologia da UFV. A equipe recebeu o reforço da entomologia com o trabalho de Tiago Trindade, que na época cursava seu mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Entomologia (PPGEnt), com orientação do professor Simon Elliot e colaboração de Arne Janssen. Diante das constatações em laboratório, o grupo passou a investigar se a mesma queda de virulência acontecia nas plantações, no contato do CPMMV com a mosca-branca, e que impacto essa variação de virulência teria na sobrevivência do próprio vírus e do vetor. “O que observamos é que a redução da virulência é benéfica para ambos, e pode ser considerada uma estratégia de sobrevivência”, conta Tiago, que é técnico de laboratório do Instituto de Saúde e Biotecnologia da Universidade Federal do Amazonas. “Se o vírus causa necrose e morte da planta, as ninfas da mosca-branca não vão conseguir sobreviver e chegar até a fase adulta – e são os adultos que dispersam o vírus para novas plantas. Nos nossos testes, nenhuma ninfa sobreviveu e chegou até a fase adulta em plantas infectadas com o isolado que causa sintomas de necrose, enquanto que a sobrevivência e o desenvolvimento de ninfas em plantas infectadas de forma mais leve foram similares ao que acontece em plantas controle (não infectadas)”.

A presença da necrose da haste da soja, neste contexto, pode ser explicada por outra estratégia de sobrevivência do vírus, que está relacionada à forma de transmissão. “O CPMMV é transmitido de forma não-persistente, ou seja, o vírus é adquirido e transmitido muito rápido (minutos ou até mesmo segundos). Isolados que causam necrose podem, portanto, reduzir a permanência das moscas brancas na planta infectada e ainda assim promover a transmissão do vírus, por meio da dispersão dos insetos para novas plantas”, acrescenta Tiago. 

Para Larissa, o mapeamento da diversidade e da virulência do vírus chama ainda mais atenção para os cuidados que devem ser tomados nas plantações. “O sintoma brandos do vírus podem ser confundidos com deficiência nutricional, então às vezes os produtores nem percebem o problema. É preciso lembrar do CPMMV quando estiver fazendo o melhoramento da soja, ficar de olho no inseto vetor e usar um cultivar resistente a esse vírus.” 

O artigo publicado na Virus Research tem assinatura também dos pesquisadores Talita Mar, Tarsiane Barbosa, Diogo Milanesi, Murilo Alves, Roberta Lima e Eduardo Mizubuti, que colaboraram em diferentes etapas do trabalho.

Foto: Larissa Zanardo

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